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Moradores de Bagé se manifestam contra mineradora às margens do Rio Camaquã


Mais de 640 pessoas participaram da audiência pública em Bagé, na quarta-feira. Créditos: Arquivo Sul 21 | Jaqueline Silveira

Nesta quarta-feira (23), foi a vez dos moradores de Bagé, Região da campanha, debaterem a instalação de uma mineradora na Vila de Minas do Camaquã, a cerca de 90 quilômetros de Caçapava do Sul. O empreendimento da Votorantim Metais Holding da canadense  Iamgold Brasil está previsto para  as Guaritas, a aproximadamente 800 metros das Palmas, no outro lado da margem do Rio Camaquã, território já de Bagé.

Bagé foi o segundo município a sediar uma das três audiências públicas realizadas pela Fundação de Proteção Ambiental (Fepam), a partir da intervenção do Ministério Público Federal (MPF). Nesta quinta-feira (24), a audiência ocorrerá em Pinheiro Machado, às 9h, na sede de camping do Clube Social Luz e Ordem. Na terça, o debate foi realizado em Santana da Boa Vista.

Apesar dos três municípios fazerem limite com o território onde a mineradora pretende se instalar, o Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) desconsideraram os possíveis danos a esses três municípios, motivando a intervenção do MPF. O empreendimento, que pretende extrair a céu aberto cobre, zinco, chumbo e “a prata como subproduto”, informação revelada pela empresa somente na última terça-feira, durante a audiência de Santana da Boa Vista, está na fase do licenciamento prévio.

A exemplo do que ocorreu em Santana da Boa Vista, o gerente do projeto, Paul Cezanne, fez uma explanação do projeto denominado Caçapava do Sul, que prevê, segundo ele, um investimento de R$ 371 milhões, inicialmente, e a geração de 450 empregos para Vila de Minas no Camaquã, Caçapava e Santana da Boa Vista. Já a arrecadação será somente de Caçapava e corresponde ao percentual de 2% da receita liquida declarada pela empresa. Também foi feita uma exposição sobre o EIA-Rima, que não contempla uma análise sobre o impacto ambiental na totalidade do território desses três municípios.

Confira parecer técnico do Ministério Público do Rio Grande do Sul

Ordem cumprida
Ao contrário do que ocorreu na audiência em Santana da Boa Vista, desta vez, a Fepam obedeceu à ordem cronológica das inscrições e cumpriu a portaria da própria fundação. Na audiência anterior, pessoas que se inscreveram no início da manhã só falaram quase no final da tarde. Antes de dar início às manifestações, o responsável pela condução da atividade, o diretor técnico da Fepam, Renato das Chagas da Silva, avisou que as folhas com as inscrições foram numeradas e, portanto, seria seguida a ordem. A maioria das manifestações foi contra a instalação da mineradora.
 

Produção sob ameaça
O temor da comunidade é ver a produção sustentável, que desperta interesse, inclusive, de mercados de outros países da América do Sul, ser desvalorizada, uma vez que estará no meio de uma área contaminada, principalmente pelo chumbo, com potencial danoso semelhante ao do mercúrio. E, segundo as manifestações, não é só a carne de bovinos, caprinos e ovinos que está ameaçada, mas também a produção de vinhos, de arroz e de doces, já que a região que poderá ser afetada pelos impactos corresponde a mais de um milhão de hectares.

O gerente do projeto repetiu o que havia dito em Santana da Boa Vista. Serão tomadas, conforme ele, todas as providências para evitar danos à região, ao mesmo tempo em que admitiu que todo “empreendimento tem impacto ambiental.” De acordo com ele, os rejeitos serão empilhados a seco e não haverá barragem e nem descarte no Rio Camaquã. “Não existe nenhum tipo de barragem, seja de rejeitos, seja de água”, afirmou Cezanne.

Diferentes segmentos do mesmo lado
A ameaça a um modo de vida sustentável reuniu do mesmo lado diferentes segmentos de Bagé e com pluralidade de pensamento. “Juntou todos os segmentos: sem-terra, quilombolas, ruralistas, produtores, diferentes pensamentos políticos por uma mesma causa. Isso é histórico em Bagé”, resumiu o médico veterinário Guilherme Collares, sobre a união de forças que presenciava. Todos, a maioria usando camisetas em defesa do Rio Camaquã, fizeram questão de ir ao microfone se posicionar. Crianças, filhos de produtores, também foram dar seu recado. “Mineradora, aqui não!” e “Chumbo, aqui não”, foram as frases mais ouvidas ao longo de seis horas de audiência.

Herança do empreendimento
Deputado estadual da região, Luiz Fernando Mainardi (PT) disse que respeitava e até compreendia a posição do prefeito de Caçapava do Sul, Otomar Vivian (PP), e do futuro chefe do Executivo de Santana da Boa Vista, Arilton Freitas (PT), em defesa do empreendimento, especialmente num cenário de crise econômica, porém era contrário ao projeto. Depois de 20 anos, tempo previsto de funcionamento da mineradora, segundo o deputado, restará para a região os impactos. “Fica para a região, para o Estado, o maior patrimônio do pampa gaúcho comprometido”, observou ele, numa referencia ao Rio Camaquã.

Vice-prefeito eleito de Bagé na chapa encabeçada por Divaldo Lara (PTB), Manoel Machado (PSDB), disse que seu município é um dos que terá a maior área impactada pelo projeto e que está ao lado da população. “Não foi bom ter deixado Bagé de fora, porque, talvez, a maior área fique dentro de Bagé. O impacto positivo que essa empresa vai deixar é muito pequeno em relação ao impacto negativo, que será muito maior. O número de empregados será só para dois municípios, então não é um projeto regional”, argumentou o vice-prefeito eleito. O futuro, de acordo com ele, depois que o empreendimento for desativado, “já se conhece: um casario velho” e nenhum progresso. “Caçapava não evoluiu nada”, justificou Machado, sobre o resultado da antiga mineradora instalada na Vila de Minas do Camaquã.

Reitora da Urcamp, Lia Quintana falou na audiência como presidente do Corede Campanha e questionou os benefícios do projeto. Também apontou falhas no EIA-Rima, aspectos levantados por pesquisadores nas duas audiências. “Neste momento, nós estamos enxergando só as oportunidades da mineração. Não perguntam quantos empregos deixarão de existir na produção agropecuária”, alertou a professora.

Pesquisador e médico veterinário, Marcos Borba iniciou, em 2009, o projeto de desenvolvimento regional com enfoque territorial junto aos produtores do Alto Camaquã, por meio da Embrapa, enfatizando que é um trabalho consolidado e que tem a participação de cinco universidades, da Emater, do governo do Estado, além de reunir oito municípios. “Esse evento deveria se chamar: a exploração de chumbo no Camaquã, e o mito do desenvolvimento”, ironizou ele, sobre a ameaça a um trabalho consolidado.

Do outro lado, poucas pessoas se manifestaram a favor da mineradora. O prefeito Otomar Vivian (PP) foi um deles. Ele disse que não poderia fugir de suas raízes. “Sou filho de mineiro e estamos aqui apoiando essa iniciativa. Nossa posição é de absoluta confiança na Fepam”, afirmou ele, debaixo de muita vaia. Alguns participantes da audiência, inclusive, viraram de costas enquanto ele falava. Mais cedo, Otomar chegou a pedir um aparte para se defender de críticas à postura da prefeitura em favor do projeto, mas foi negado devido à pressão popular. Sobraram muitas vaias também para o gerente do projeto, Paul Cezanne, ao afirmar que ”a intenção” da empresa não era contribuir economicamente com o PIB (Produto Interno Bruto) do Estado.

Presidente da Associação de Moradores da Vila de Minas do Camaquã, Guacira Pavão disse que há 145 anos existe mineração na região e que não comprometeu o Camaquã. “Até aonde se sabe não existe poluição, o Rio Camaquã continua lindo, limpo”, comentou ela. Na visão da moradora, haverá “impactos de sustentabilidade” com a instalação da mineradora, como melhorias nas estradas. Mais uma vez, o promotor de Justiça Ricardo Rodrigues acompanhou a audiência.

Fonte: Jornal Sul 21 

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